Há tempos que não apresentava nada nesse espaço dessa mísera favela, mas
a situação mudou quando me deparei com a obra de Osamu Dazai (1948). É
simplesmente impossível ler essa obra e não ser tocado, ou melhor, abraçado por
toda desesperança e amargura que Declínio de um homem evoca.
Essa foi a última obra que o autor publicou antes de cometer suicídio
dias antes de completar 38 anos e nessa obra há diversos da vida do autor
(talvez seja um dos motivos para que esta venha ter tanta força – afinal o
autor depositou os pedaços finais de sua trágica vida nela).
A história é uma espécie de relato autobiográfico do “jovem” Yozo
apresenta os motivos de seu “declínio como ser humano” e justamente nesses
motivos vemos diversos aspectos que nos acompanham diariamente. O primeiro
deles é a nossa cada vez mais profunda incapacidade empática; na obra temos
esse ponto inicial com a grande família do personagem principal onde todos
estão completamente atarefados e não conseguem perceber a fragilidade de Yozo.
Se pensarmos nas várias instituições de nossa querida sociedade veremos esse
mesmo ponto: Nossas famílias crescem mortas, as escolas são lugares inóspitos e
falidos que se quer conseguem transmitir conhecimento quanto mais ajudar a
humanizar as Igrejas cristãs... Até o Deus delas já era...
O segundo ponto de Declínio do Homem que Yozo passa é a falsificação de
si próprio, pois desde cedo ele viu a sujeira das pessoas e devido a sua
insegurança que cada vez mais foi se tornando sua fraqueza não foi capaz de
combatê-la e para esconder sua angústia criou uma persona alegre: Ele que era
um ser melancólico e temeroso por dentro tornou-se um piadista, um rapaz
extremamente divertido por fora, capaz de arrancar sorrisos de qualquer e assim
esconder suas angústias e o medo constante das pessoas que trazia consigo. E
quantas vezes nós mesmos não seguimos esse caminho de inautenticidade construindo
uma máscara que melhor se adapte as normas falidas de nossa sociedade. Quantas
vezes aceitamos destruir nossos sonhos e desejos apenas para termos a falsa
aceitação de pertencermos a um maldito grupinho... Mas essa tática não dá
certo... E Yozo nos mostrou perfeitamente o seu fracasso...
Temos o
terceiro e o 4 ponto do declínio do homem (Coloco os dois juntos para tentar
evitar qualquer tipo de Spoiler sobre a obra).
Uma hora nossas máscaras acabam caindo e aí somos obrigados a encarar a
desgraça dessa Era ou fugir dela – Yozo escolheu fugir da Era e fez isso
através das drogas e uma bem conhecida que geralmente está a nossa mão o
álcool. Yozo assim como o próprio autor tiveram problemas terríveis com o
álcool e vemos tudo ao seu redor ser destruído. E como nenhum homem é uma ilha
Yozo acaba levando ou contribuindo para arruinar a vida de diversas mulheres ao
longo de sua vida. Cabe aqui um trecho da obra que se encontra inclusive na traseira
do livro:
“Com
o tempo, aprendi que bebidas, cigarros e prostitutas eram os instrumentos que
eu dispunha, ainda que de forma temporária para dissipar meu pavor dos seres
humanos. Mesmo se precisasse vender tudo o que possuía para dispor desses
instrumentos, eu o faria de bom grado.”
Infelizmente essa é uma das posições mais freqüentes em nossos dias,
quantas mulheres e meninas não são simplesmente destroçadas para que nós e
(principalmente os homens possam aliviar suas vergonhas, medos ou possam se
mostrar poderosos para os outros)? Ou pior, quantos casamentos não são o palco
onde uma destruição mútua ocorre diariamente?
Temos nessa obra a retratação das favelas existentes em nós. Osamu Dazai
através de Yozo mostrou deu voz a alguém que já estava morto em vida – alguém
que foi transformado em um pilho e nos convidou a olhar para os diversos
piolhos existentes em nossa sociedade. Talvez uma olhada rápida no visor do seu
celular ou em algum espelho de sua casa mostre um dos primeiros piolhos que
devem ser ajudados...
Devemos pensar o Declínio de um Homem como a última esperança de não ver
declinada o último fio que segura essa pobre coitada... Essa obra foi criada
para que possamos procuramos o Yozo dentro de nós e pelas vielas e sarjetas
afogados na bebida, nas devassidões e no desespero que cria cada dia mais
favelas intransponíveis.
Essa
é com toda certeza uma obra que merece ser lida.
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